Renato Veltri: O clube que não sabe tratar seus ídolos (ainda sobre Pedro)

Sampaoli fica, Pablo sai, Pedro é multado. Esse é o saldo de uma das coisas mais absurdas que já vi acontecer no Flamengo. E com as matérias que vieram a tona, fica cada vez mais claro que o Flamengo não sabe como tratar seus ídolos.

Não é de hoje. Zico, o Deus rubro-negro foi vendido a preço de banana porque um engravatado decidiu que era inadmissível que ele fosse dono do seu “passe”. Preferiu-se ganhar a fortuna de um milhão de reais para desperdiçar do que se manter com sua maior figura. O mesmo Zico voltou para o Flamengo em outra função para sofrer novamente. Outro engravatado teve a audácia de colocar honra dele à prova.

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Em outras proporções, temos Pedro. O rei da América sofreu o que já sabemos que sofreu. E mais uma vez o Flamengo fez a pior coisa possível. A começar pelo não pronunciamento do clube mais de 24 horas após o ocorrido, oque -fala-se- teria sido um acordo do Flamengo com Sampaoli. O Flamengo não defendeu o seu. E ainda há aqueles que condenam Pedro por seu post.

O post, aliás, fala em “pressão psicológica” sofrida pelo atacante nas últimas semanas. Não sabemos de detalhes mas segundo matéria de Cahê Motta, Pedro teria se sentido ofendido ao ouvir a frase “Você é muito religioso, precisa brigar mais!”. Esta frase demonstra a absurda falta de tato do treinador. Atualmente muito se fala em treinadores ultrapassados enquanto dinossauros como Luxemburgo e Felipão voltam à cena do futebol. Entretanto, me parece que muitos só vêm isso por um prisma.

Sampaoli e a culpa

Um treinador é também um gestor e isso até o Sampaoli concorda. E atualmente é necessário que se saiba gerir pessoas, além de gerir processos. Ao citar a religião de Pedro, Sampaoli demonstra não entender nada disso. Cometeu-se um absurdo que poderia ser facilmente visto como intolerância religiosa nos dias de hoje. Apesar disso, não creio ter sido a intenção do treinador.

A explicação é outra. O careca é limitado. Não apenas no que diz respeito a futebol, mas no tocante a trato com humanos. Qualquer um que trabalhe em uma empesa gigante hoje em dia (como é o Flamengo) tem pelo menos noção de que se deve evitar fazer comentários que levem em consideração aspectos sensíveis.

Imagine a situação na qual você indaga seu chefe de porque de não ter recebido a promoção a despeito de sua entrega ser maior que o colega que recebeu e a resposta seja “Você é favelado demais. Precisa falar mais baixo”. Existem gestores que acreditam que apenas os “mais adaptáveis” vão ficar consigo, e existem aqueles que entendem que para manter os melhores é preciso adaptar o trato humano a eles.

Pablo, Sampaoli, MaCarthur e Roosevelt

Toda essa situação me lembrou um caso interessante na segunda guerra mundial. Douglas MaCarthur que havia sido considerado herói na primeira guerra, era o General Americano que lutava no pacífico. Foi também o herói de uma épica retomada das Filipinas das mãos dos japoneses.

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Em determinado momento, o moral das tropas de MaCarthur estava em baixa e um soldado – provavelmente com PTST- se recusou a sair para lutar. O General então deu um tapa na cara dele e disse para “deixar de ser viadinho”. Isso chegou aos ouvidos da imprensa e Roosevelt – apesar de a contra gosto- não teve alternativa a não ser chamar de volta e censurar publicamente um de seus melhores homens.

Percebam que nem em um ambiente de guerra, onde tudo é um tanto mais… permissívo, tal ato foi tolerado ou relarivizado. E o que fez Sampaoli diante de algo parecido ? O infeliz post onde iguala agressor e agredido. Sampaoli não teve a grandeza e sagacidade de Roosevelt diante de Pablo, que não é exatamente o MaCarthur.

E este homem continuará a ser quem comanda Pedro.

Punição: a falsa sensação de controle.

E para fechar, vem a punição de Pedro. Teoricamente ela é correta. Mas como dizem, na prática, a teoria é outra. O atacante cometeu um ato de indisciplina. Em condições normais de temperatura e pressão, seria de bom que houvesse punição. Entretanto, é necessário que se analise contexto.

Um homem de 26 anos acaba de passar por uma das maiores humilhações de sua vida. Este homem está se sentido perseguido e psicologicamente reprimido pelas palavras do chefe. E não bastasse o fato de a diretoria não ter identificado e tratado isso antes para previnir o pior, quando a coisa estoura, é inflexível na aplicação da “lei”.

Vi torcedores e jornalistas clamando pela punição ao camisa 9 e parabenizando a diretoria pelo que – para mim – é um imenso erro. Mais uma vez demonsta-se uma visão de gestão antiquada que não entende pessoas e que não consegue fazer nada além de manuais. Mais uma vez, não sabemos tratar nossos ídolos.

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Infelizmente o tempo de Pedro conosco vai se aproximando de um fim. Considero improvável que esteja aqui em 2024. Espero que saibamos repor talentos ao invés de investir o dinheiro que conseguiremos com ele em novos Cebolinhas, apesar de achar bem difícil. Por fim, só resta o pesar. Não precisava acontecer, não precisava ser assim, mas é.

Toque final: Logo após o término da edição desse texto, abri as notícias e me deparei com a falta do atacante no treino. Mais um ato de indisciplina e que mostra que o jogador não está satisfeito com a resolução do caso. Deverá sofrer nova punição. Mais uma crise pros que não sabem gerir crise.

Fonte: Mundo Rubronegro

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